quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

CARL GUSTAV JUNG


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Carl Gustav Jung e a psicologia analítica. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição

O ego é o centro da consciência; o self é o centro da psique total, incluindo tanto o consciente quanto o inconsciente. Para Jung, existe uma interação entre os dois. P 89

Jung nunca pôde aceitar a insistência de Freud de que as causas da repressão são sempre trauma sexual. Freud, por sua vez, sempre se sentiu desconfortável com o interesse de Jung pelos fenômenos mitológicos, espirituais e ocultos. P 91

Jung considerava libido como energia psíquica generalizada, ao passo que Freud insistia intransigentemente que a libido era energia sexual. P 91

Em 1944, quando tinha 69 anos, Jung quase morreu após um grave colapso cardíaco. No hospital, ele teve uma poderosa visão em que parecia estar flutuando no espaço, a centena de quilômetros da terra (...). Pela primeira vez, ele viu sua vida como parte de uma grande matriz histórica. Antes de poder entrar no templo, Jung foi confrontado por seu médico, que lhe disse que ele não tinha o direito de deixar a terra naquela hora. Naquele momento, a visão chegou ao fim. P 91-92

Ao avaliar os sonhos como a mais importante fonte de informações referentes aos processos inconscientes, Freud devolveu à humanidade uma ferramenta que parecia irrecuperavelmente perdida. P 92

Jung formulou uma teoria que incluía tanto o inconsciente pessoal quanto o coletivo. O inconsciente pessoal é composto de memórias esquecidas, experiências reprimidas e percepções subliminares – é semelhante ao conceito de inconsciente de Freud. P 92-93

Os conteúdos do inconsciente coletivo, também conhecido como inconsciente impessoal ou transpessoal, são universais e não se enraízam em nossa experiência pessoal. P 93

“Compreendi que o inconsciente é um processo, e que a psique se transforma ou se desenvolve pelo relacionamento do ego com os conteúdos do inconsciente” p 93

O introvertido se sente mais confortável com o mundo interior de pensamentos e sentimentos. O extrovertido se sente mais à vontade com o mundo dos objetos e das outras pessoas. P 94

Os introvertidos vêem o mundo em termos de como este os afeta, e os extrovertidos estão mais interessados em seu impacto sobre o mundo. P 94

Os introvertidos interessam-se sobretudo por seus próprios pensamentos e sentimentos, seu mundo interior; eles tendem a ser introspectivos. Um dos perigos para pessoas deste tipo é que, à medida que ficam imersas em seu mundo interior, podem perder o contato com o mundo ao seu redor. P 94

Os extrovertidos estão ativamente envolvidos no mundo das pessoas e das coisas; tendem a ser mais sociáveis e mais conscientes do que está acontecendo à sua volta. P 94

Jung pressupõe que a mente do bebê já possui uma estrutura que molda e canaliza todo posterior desenvolvimento e interação com o ambiente. Esta estrutura básica é essencialmente a mesma em todos os bebês. P 96

O inconsciente coletivo, que resulta das experiências comuns a todas as pessoas, também inclui material de nossa genealogia pré-humana e animal. P 97

Jung sugeriu que existe um nível de imagens no inconsciente comum a todas as pessoas. Ele também descobriu uma íntima correspondência entre os conteúdos oníricos dos pacientes e os temas míticos e religiosos encontrados em muitas culturas amplamente dispersas. P 97

“Os arquétipos do inconsciente são manifestações dos órgãos do corpo e dos poderes. Os arquétipos têm base biológica” (Campbell, 1988, p. 51) P 98

Não existem elementos inconscientes no ego, apenas conteúdos conscientes derivados da experiência pessoal p 99

A persona inclui nossos papéis sociais (...). O termo persona vem do latim e significa “máscara”, ou “rosto falso” (...). A fim de funcionar socialmente, todos nós precisamos representar de maneiras que definem nossos papéis p 100

A persona tem aspectos tanto negativos quanto positivos. Uma persona dominante pode sufocar o indivíduo,... p 100

A persona muitas vezes pode ser crucial para nosso desenvolvimento positivo. À medida que começamos a desempenhar um determinado papel, nosso ego gradualmente vai se identificando com ele. Este processo é fundamental para o desenvolvimento da personalidade. P 100

A sombra é uma forma arquetípica que serve como foco para o material que foi reprimido da consciência; seu conteúdo inclui aquelas tendências, desejos e memórias que são rejeitadas pelo indivíduo por serem incompatíveis com a persona e contrárias aos padrões e ideais sociais. P 100

A sombra contém todas as tendências negativas que o indivíduo deseja negar, incluindo nossos instintos animais.. p 100-101

Quanto mais forte é nossa persona e quanto mais nos identificamos com ela, mais negamos outras partes de nós mesmos. A sombra representa o que consideramos inferior em nossa personalidade e também aquilo que negligenciamos e nunca desenvolvemos em nós mesmos. P 101

Em seu trabalho sobre repressão e neurose, Freud concentrou-se sobretudo em aspectos da sombra. Jung constatou que o material reprimido é organizado em torno da sombra, a qual se torna , em certo sentido, um eu negativo, ou a sombra do ego. P 101

Cada porção reprimida da sombra representa uma parte de nós mesmos. Quando mantemos este material inconsciente, limitamos a nós mesmos. À medida que nos tornamos mais cônscios da sombra, recuperamos partes anteriormente reprimidas de nós mesmos. P 102

A sombra (...) oferece ao indivíduo acesso a grande parte do material inconsciente valioso que é rejeitado pelo ego e pela persona. P 102

Segundo Jung, “Consciente e inconsciente não estão necessariamente em oposição um ao outro, mas complementam um ao outro para formar uma totalidade, que é o self (1928b, p. 175) p 103

Um símbolo pode representar a situação psíquica do indivíduo, e ele é aquela situação em um dado momento. P 104

“A função geral dos sonhos”, escreveu Jung, “é tentar restaurar nosso equilíbrio psicológico produzindo material onírico que restabeleça, de modo sutil, o equilíbrio psíquico total” (1964, p 50) p 104

Tudo que nos acontece, se devidamente compreendido, nos leva de volta a nós mesmos... (1973, p 78) p 106

Quando analisamos a persona, retiramos a máscara e descobrimos que o que parecia individual é, no fundo, coletivo; em outras palavras, que a persona era apenas uma máscara para a psique coletiva. Fundamentalmente a persona não é nada real: é uma conciliação entre o indivíduo e a sociedade quanto ao que um homem deveria parecer. P 107

Ao tomar consciência das limitações e distorções da persona, tornamo-nos mais independentes de nossa cultura e de nossa sociedade. P 107

O reconhecimento de Jung da importância dos símbolos e suas interpretações são contribuições mais importantes que ele fez à psicologia. P 112

Memórias esquecidas, experiências reprimidas e percepções subliminares formam o inconsciente pessoal. Os conteúdos no inconsciente coletivo não estão enraizados na experiência pessoal, mas são universais através do tempo e das culturas. P 115

As imagens arquetípicas podem ser vistas em muitas culturas e durante muitas épocas históricas, como demonstram os temas comuns nos mitos, contos populares e lendas do mundo. P 115

O inconsciente coletivo contém a herança da evolução espiritual da humanidade. P 115



SHAMDASANI, Sonu. Jung e a construção da psicologia moderna: o sonho de uma ciência. Aparecida-SP: Editora Idéias & Letras, 2003, 414p.

Jung comparava o perfil clínico da histeria e da esquizofrenia, resumindo as diferenças ao dizer que o primeiro quadro consistia num movimento centrífugo da libido, ao passo que o segundo era causado por um movimento centrípeto. O movimento centrífugo, no qual interesses da pessoa são predominantemente dirigidos para o mundo exterior, recebeu o nome de extroversão. O movimento centrípeto, no qual o interesse do indivíduo é dirigido para si mesmo, foi denominado de introversão. P 77

Jung argumentava que o trabalho de Freud era um exemplo de uma teoria extrovertida, ao passo que o trabalho de Adler representava um exemplo de teoria introvertida. P 77

O elemento comum ao trabalho de todos eles era o fato de “o inconsciente ser elevado à condição de uma força mística que instala um despotismo secreto no indivíduo” (37). A limitação desse dualismo interno da personalidade, desse sujeito dividido, era sua ânsia essencial ser concebida de maneiras diferentes conforme a escola. P 87

Quer sejam vistos como realizações de desejo ou compensações, os sonhos são amplamente entendidos como revelações da personalidade, oriundas do inconsciente, e essa noção parece ser o legado de Freud e Jung. P 117

Entre os psicoterapeutas, os jungianos são largamente considerados aqueles que mais dão ênfase aos sonhos. P 119

Em 1923, em O ego e o Id, Freud afirmou que a maior parte das pessoas versadas em filosofia não poderia simplesmente conceber que algo psíquico não fosse também consciente. Ele explicava que isso era causado pelo fato de nunca terem estudado os sonhos e a hipnose (SE 19, 13). Essa afirmação levaria a pessoa a concluir que, estudando os sonhos e a hipnose, ela conseguiria compreender o que a tradição filosófica tinha considerado impensável, e que a psicanálise havia conseqüentemente superado a tradição filosófica. P 121

Descartes (1596-1690) ponderava sobre o fato de que, em seus sonhos, a pessoa podia ter as mesmas experiências que os loucos tinham quando acordados, ... p 122

...para Descartes o sonho era principalmente usado como argumento que destruía a autoridade da experiência ssensorial, em vez de como argumento que destruía a autoridade da experiência sensorial, em vez de como objeto de pesquisa propriamente dita (1968, 26). P 122

Para os cartesianos, os sonhos eram a forma assumida pelos pensamentos durante o sono. P 122

Por exemplo, em Princípios da compreensão humana (1671), o filósofo inglês John Locke (1623-1704) disse: “Os sonhos do homem adormecido são, em minha forma de ver, todos constituídos pelas idéias do homem acordado, embora, em sua maior parte, reunidas de maneira incomum” (41). Locke defendia um modelo subtrativo para o sonho, considerando que sonhar era ter idéias não sugeridas pelos objetos externos. P 122

A própria antiguidade do gênero era invocada como testemunho da veracidade dos simbolismos oníricos. Benedetto Gentille começava o Livro dos sonhos ou Oniroscópio, de 1882, citando a crença na adivinhação dos sonhos alimentada pelos egípcios, caldeus, gregos e romanos (6). P 123

Em vez de entender o sonho como uma condição derivada inferior da consciência da pessoa acordada, este passou a ser entendido como um estado superior. O médico-filósofo Ignaz Toxler (1780-1866) considerava o sonho “a revelação da própria essência da pessoa”. P 126

O estudo mais proeminente dos sonhos foi realizado em 1814, por Gotthilf Heinrich Schubert, e se chamou O Simbolismo dos sonhos.(...). A alma de expressa mais plenamente nos sonhos. A linguagem dos sonhos era mais apropriada a sua natureza do que a linguagem natural, e infinitamente mais expressiva (1814, 35). Os sonhos originavam-se do “poeta escondido em nós”, esua linguagem era poética e metafórica. P 126

A linguagem onírica era uma atividade natural da alma. P 126

Ele salientava a função protetora dos sonhos. Uma grande parte de nossas imagens oníricas parecia ser o produto de um espírito benfazejo, que nos protege. A associação de idéias da consciência, nos sonhos, era diferente da associação mental que acontecia com a pessoa acordada, e oposta a esta: p 126

Desde a Antiguidade, o principal uso dos sonhos na medicina era como recurso diagnóstico. Consideravam que os sonhos revelavam o verdadeiro estado do corpo. Essa abordagem continuou em evidência durante o século XIX, e foi apresentada em 1830 por Robert Macnish (1802-1837), em seu popular A filosofia do sonho.(...). As condições essenciais ao sonhar eram a suspensão dos julgamentos, acompanhada de um estado ativo da memória e da imaginação (50). Os sonhos tinham uma significativa função mnemônica, pois eram capazes de trazer à mente acontecimentos que haviam sido esquecidos, ... p 128

Em sua crítica da razão (1790), Kant havia proposto que os sonhos tinham a finalidade de estimular os órgãos vitais por meio da imaginação. P 129

O médico alemão Johann Reil (1759-1813), que foi quem cunhou o termo “psiquiatria”, considerava os sonhos análogos à loucura: “Nos sonhos, sempre estamos de lá para cá no que parecem espaços, tempos e nossa pessoa. Saltamos de uma parte do mundo para outra, de um século para outro, e desempenhamos todos os papéis, de rei a mendigo, que a fantasia mágica nos confere. Ocorre precisamente o mesmo na loucura, que é o sonho com a pessoa acordada (1803, 87). P 131

Em meados do século XIX, um dos mais conhecidos manuais de psiquiatria era intitulado Patologia e terapêutica da mente, do psiquiatra alemão Wilhelm Griesinger. [...]. Em pessoas perturbadas, os sonhos realizavam o que a realidade lhes havia recusado. Assim, ele afirmava que, nos sonhos e na insanidade, era comum constatar-se a realização imaginária dos desejos, e a reversão de decepções. P 131

De acordo com Havelock Ellis, foi Maury (Alfred Maury) quem, em 1861, inaugurou o estudo moderno dos sonhos (1991, vi).[...]. No sonho, a pessoa é então inteiramente revelada a si mesma, em toda a sua nudez e miséria original. Uma vez que nele está suspensa a ação de sua vontade, a pessoa torna-se um joguete de todas as suas paixões, das quais, quando está acordada, se defende com os sentimentos da honra e do medo (1861, 88). P 133

Com a expressão dos conceitos de memória e herança, estava aberto o caminho para que os sonhos fossem concebidos como reanimações de lembranças culturais ou ancestrais. Em 1876, o psicofisiologista britânico Thomas Laycock (1812-1876) afirmou que, nos sonhos, retrocedemos para um tempo anterior ao de nossos ancestrais imediatos, alcançando o “substrato da raça nascida desde a vida selvagem vivida em eras remotas”. P 134

Em 1861, Karl Albert Scherner, filósofo da Universidade de Breslau, publicou um estudo intitulado A vida do sonho. (...). Scherner dizia que a atividade psíquica nos sonhos se expressava por meio de uma linguagem simbólica, e que era possível interpretá-la. Enquanto estava dormindo, a pessoa era dotada de uma maior sensibilidade às sensações corporais. Estas se traduziam em imagens oníricas. Por conseguinte, a maior parte desse simbolismo se relacionava o com o corpo humano. Ele enfatizava do simbolismo sexual disfarçado nos sonhos. P 135-136

No dia 12 de março de 1880, Francis Galton escrveu para Sully: [...]. Havia três maneiras principais de considerar os sonhos como revelações. (...). O sonho “desnuda o ego de suas camadas artificiais e o expõe em toda a sua rude e primitiva nudez. Ele traz, desde as escuras profundezas de nossa vida subconsciente os impulsos primários instintivos” (358). A segunda perspectiva consistia numa analogia entre os fenômenos da personalidade dupla ou alternada, o transe hipnótico e os sonhos. Utilizando uma noção da multiplicidade do si-mesmo que lembrava fortemente o modelo proposto por William James em Princípios de psicologia, ele argumentava que os sonhos eram meios de preservar essas sucessivas personalidades. (...) Na terceira modalidade, ele afirmava que os sonhos davam livre vazão às características e tendências individuais. Na vida social, uma grande parte de nossos traços mais vitais e profundos é “reprimida e atrofiada” (363). Ele defendia que eram precisamente tais aspectos que os sonhos revelavam. P 136-137

Em 1875, o filósofo alemão Johannes Volkelt produziu um estudo intitulado A fantasia onírica. [...]. Em conclusão, ele postulava que as indagações milenares da filosofia poderiam ser enfim respondidas com um exame dos sonhos: “O enigma do mundo, para cuja solução os filósofos vêm há muito tempo se esforçando de maneira geralmente inútil, é praticamente solucionado todas as noites nos sonhos... Neles, estamos próximos da camada mais interior da vida.. (208)”. p 139

Em 1893, antes de Freud ter comparado o sonho a um sintoma histérico, Janet estendeu essa analogia para englobar a histeria: “Os histéricos não se contentam com sonhar constantemente à noite; eles sonham o dia inteiro” (1893,201). O significado terapêutico dos sonhos era que, em geral, eles revelavam o evento patogênico. P 141

O subconsciente era considerado uma espécie de sonho contínuo. Rosimarie Sand diz que Janet, Charcot e Karfft-Ebing “eram familiarizados com idéias que, mais tarde, surgiriam como conceitos essenciais da teoria freudiana dos sonhos. (...). Pierri Janet acreditava que as causas da histeria eram freqüentemente retratadas nos sonhos, e os utilizava para monitorar o relacionamento terapêutico com ele mesmo. Richard Von Krfft-Ebing pensava que os desejos sexuais inconscientes poderiam ser detectados nos sonhos (1992, 215)” p 141

...o psicólogo suíço Theodore Flournoy (1854-1920) levava a vantagem de ser tanto médico quanto filósofo. (...). Ao anotar seus sonhos, Flournoy entendia que a fonte de suas imagens oníricas estava as experiências que havia tido antes de dormir. [...]. Flournoy publicou Da Índia ao planeta Marte, um estudo de uma médium espírita. A médium de Flournoy, cujo pseudônimo era Hélène Smith, alegava ser a reencarnação da Maria Antonieta, da princesa hindu Simandini, e uma freqüente visitante do planeta Marte. (...). Flournoy dizia que os romances espiritualistas (...) eram análogos a sonhos, e explicavam que eram o produto de uma espécie de incubação subconsciente. Seu conteúdo consistia em criptomnésias, termo que havia cunhado para expressar o fato de que “certas lembranças esquecidas reaparecem no sujeito para que ele enxergue nelas algo novo” (1900/1994, 8) p 145-146

Retomando a noção de devaneios subconscientes de Janet, ele dizia que (...) as produções da médium representavam apenas irrupções momentâneas de um sonho subliminar latente. (...) Essas fantasias serviam a duas funções: eram compensações das dificuldades que a pessoa sofria na vida, e tinham uma função teleológica . Ele designava essa última função com a expressão “automatismos teleológicos”, com o que ele queria dizer impulsos úteis e protetores que preparavam o futuro. De maneira significativa, ele entendia que os sonhos não se referiam exclusivamente ao passado, mas possuíam também uma dimensão futura. P 146

Jung [...]. Ele descrevia os sonhos como expressões simbólicas dos complexos. Estes, que se haviam revelado nos experimentos de associação, também constelavam os sonhos (OC 2, §844). Em sua análise do caso, Jung refazia o trajeto dos sonhos da paciente, coligando-os a um complexo sexual. O complexo, qualquer que fosse ele, datando de qual época fosse, poderia ser revelado num sonho, e nem todos os complexos envolviam desejos. P 151

Jung considerava os sonhos a expressão simbólica dos complexos (OC 3, §140). Quanto à formação dos sonhos a partir dos complexos, ele observou: “Flournoy indicou as raízes dos complexos nos sonhos da famosa Hélène Smith. Eu considero o conhecimento desses fenômenos indispensável ao entendimento dos problemas discutidos aqui” (§298, trad. Mod.) p 153

Jung ficou insatisfeito com essa interpretação em termos pessoais. Bennet notou que “Jung achava a manipulação dos sonhos que Freud realizava um caso de sua tendência para fazer com que os fatos se encaixassem em sua teoria” (...). Foi nessa momento que ele chegou a uma concepção dos sonhos completamente diversa da apregoada por Freud, a saber, que o sonho era a natureza: “O inconsciente tem uma função natural, da qual a consciência é totalmente dependente. [...]. Tomando-se esses depoimentos em conjunto, ele parece ter entendido esse sonho como indício de que os sonhos revelam não só recordações pessoais, mas também culturais. Os sonhos poderiam ser considerados a via régia de acesso à história cultural. P 157

...o psicanalista Karl Abraham (1877-1925) descrevia os mitos como fantasias de um povo (...). Abraham tentava explicar a analogia entre mitos e sonhos, dizendo que os mitos eram os remanescentes da infância de um povo. Eram fragmentos da vida psíquica infantil dos povos, contendo em forma velada seus desejos infantis pré-históricos (180). Assim, os mitos poderiam ser considerados os sonhos de um povo. P 157

Jung afirmou que os sonhos não eram egocêntricos. A natureza sempre expressa os propósitos da espécie, e o neurótico sofre devido a seu egocentrismo. Conseqüentemente, o sonho funciona como uma correlação biológica, e representa a “moralidade biológica”. P 162

Enquanto Freud alegava que a origem do sonho estava num desejo incompatível do dia anterior, Jung propunha que ela estava num problema ainda não resolvido do dia anterior. Depois, tratava do verdadeiro significado do sonho, que ele alegava estar na solução de um problema, apresentada em pinceladas simbólicas. P 163

Como o sonho trazia material subliminar até o plano da consciência, exercia uma função compensatória e, na medida em que indicava simbolicamente uma solução, tinha uma função finalista. P 163

Se Freud fora o primeiro a compreender que os sonhos tinham significado, Jung era supostamente o primeiro a compreender seu verdadeiro sentido. P 165

O que Maeder, Adler e Jung estavam propondo era uma versão psicológica do sonho profético e diagnóstico. P 165

Em 1916, Jung tinha usado o termo “arquétipo” para designar as imagens mitológicas filogenéticas.. (...). Além de propor uma função de orientação futura ou prospectiva para o inconsciente, ele afirmava que essa função promovia o processo de desenvolvimento individual. P 171

Jung realizou algumas pesquisas clínicas de “negros”, que o convenceram de que os padrões coletivos não só eram herdados racialmente, como eram ainda universais. Foi a presença de motivos obscuros da mitologia clássica nos sonhos desses pacientes que impressionou Jung. Com base nesses casos, ele afirmou que a aparente similaridade transcultural dos motivos oníricos era evidência de uma camada universalmente humana do inconsciente, o inconsciente coletivo, fonte dessas imagens. P 177

Para Kant, a questão era determinar que forma a cognição deveria adotar para tornar possível uma experiência do mundo. (...). Dizia que, apesar de indubitável que todo conhecimento começa com a experiência, não era de modo algum o caso de ele ser totalmente derivado dela, como defendiam os empiristas Locke e Hume. O conhecimento puro consistia em noções universais a priori que não eram derivadas da experiência. P 189

O inconsciente era a fonte primordial da vida. O desenvolvimento da vida era teleológico “certa meta, uma antecipação, deve existir inconscientemente para que a vida se desenvolva nessa direção e aspire alcançá-la” (22). P 195

O desenvolvimento de conceitos do inconsciente na filosofia alemã, que não foram assimilados pelas filosofias britânica e francesa, culminou no trabalho de Eduard vom Hartmann (1842-1906). Seu principal trabalho, A filosofia do inconsciente. O inconsciente forma e preserva o organismo e, por intermédio dos instintos, preserva o indivíduo e a espécie. Ele entendia que havia uma pluralidade de instintos: autopreservação, vergonha, nojo, modéstia, gratidão, amor maternal, e também os instintos sexuais, sociais e de aquisição. (...). O inconsciente é atemporal e a-espacial, e nunca erra. P 196

Nietzsche postulou uma série de instintos e impulsos, entre os quais incluiu o da formação de bandos, o social, um instinto de liberdade, o maternal, o religioso, o da crueldade, o científico, um instinto para a hierarquização, para a limpeza, para a defesa e o ataque, e o impulso causal. Todos esses impulsos e instintos, considerados num nível fundamental, eram manifestações da vontade de poder. P 213

Todo impulso tinha a tendência de tornar-se dominante..... p 214

A ligação estabelecida (...) entre a vontade de Schopenhauer e a libido também é retomada (...). “A Schopenhauer, devo a visão dinâmica da psique; a 'vontade' é a libido que está no fundo de tudo” (De Ângulo, 1952, 204).

Ele comentou que, na natureza, o instinto para a preservação da espécie [Instinkt der Arterhaltung] e o instinto de autopreservação [Instinkt der Selbsterhaltung] eram indistintos, e só se podiam ver o impulso de vida [Lebenstrieb] e o desejo de viver [Willen zum Dasein]. Jung afirmava que essa concepção coincidia com a formulação do conceito de vontade por Schopenhauer. Portanto, libido se relacionava com toda forma de desejo. P 242

Jung acrescentava que o conceito freudiano de libido “é entendido de maneira tão inócua que Claparède comentou comigo, certa feita, que se poderia usar perfeitamente uma outra palavras, como “interesse”. p 243

“não difere muito da de Schopenhauer e de Nietzsche em Wille zur Macht, ou do élan vital, de Bergson, da 'força vital' de Shaw e o 'impulso vital' de tantos outros autores, todos eles equivalentes ao que Freud denomina de Libido”. P 245

Em sua revisão de 1913 de Transformações e símbolos da libido, Flournoy acolheu favoravelmente a reformulação de Jung para o conceito de libido. Disse que, nesse trabalho, a libido se tornara equivalente à “vontade de viver” de Schopenhauer, à “energia” de Ostwald e ao “élan vital” de Bérgson. P 246

A psicologia dos processos inconscientes, Jung definiu o inconsciente absoluto ou coletivo como “resíduo de todas as experiências do mundo, de todas as épocas e, portanto, também uma imagem do mundo, que vem sendo construída desde o alvorecer dos tempos”. P 254


O que Jung estava propondo era uma audaciosa ampliação desse conceito, para além do alcance da memória individual, a fim de abranger a memória da humanidade. Sua suposição era que nada que a humanidade já tenha vivido está verdadeiramente perdido. Os resíduos das experiências passadas deixam suas marcas no inconsciente coletivo, que não é mais do que a herança coletiva da humanidade. P 254

Para Jung, a herança filogenética não consistia apenas dos resíduos de modos de funcionamento humano, mas também continha resíduos funcionais dos ancestrais animais. P 254-255

O inconsciente coletivo é “o depósito de todas as experiências humanas, desde seus mais remotos primórdios” ((§339). Esse depósito não era inerte, mas formava um “sistema vivo de reações e aptidões que determinam a vida individual de maneiras invisíveis”. O inconsciente coletivo continha toda a herança mental ou espiritual da evolução da humanidade, que “renascia outra vez na estrutura cerebral de cada novo ser humano (§342). P 259

A tarefa da psicoterapia consiste em encontrar o antigo no moderno, e depois reconciliar os dois. Teorias da memória filogenética, ancestral ou orgânica, há muito tempo descartadas pela biologia, nas primeiras décadas do século XX, foram preservadas e institucionalizadas na psicoterapia. P 260

Os arquétipos agiam de maneira análoga aos instintos. Da mesma maneira como estes compeliam o homem a uma conduta de vida especificamente humana, os arquétipos compeliam a intuição do homem e sua compreensão de maneiras especificamente humanas. Assim, o inconsciente coletivo consistia em instintos, de um lado, e arquétipos de compreensão, de outro. P 263

Para Jung, “o processo da cultura consiste em dominar cada vez mais o animal que há no homem” (OC 7, §427, trad. mod). Entretanto, esse processo de domesticação poderia não ocorrer sem uma rebelião por parte da “natureza animal”. Essa rebelião havia se tornado aguda após a revolução industrial, porque o crescimento de cidades de vários tamanhos, junto com a progressiva industrialização, removera as possibilidades de saída para a expressão de energias afetivas. Dessa maneira, as pessoas das cidades acabavam acumulando excesso de energia. No entanto, essa energia sexual contida entra em conflito com “a moralidade até certo ponto ascética e dotada de uma tendência sexualizada especialmente hipócrita, vigente em nossos tempos” (§430, trad. mod). O resultado desse conflito é a neurose, que representava “uma tentativa mal-sucedida por parte do indivíduo, de solucionar o problema geral em sua própria pessoa”. P 272

Para Jung, foi a expansão do cristianismo, junto com a industrialização, que acarretou o problema com os impulsos, a animalidade e a sexualidade. P 273

...quando as pessoas conseguiam uma melhor relação com seu próprio “animal interior”, conseguiam valorizar mais a vida. Viver iria tornar-se o princípio moral absoluto, e o indivíduo reagiria instintivamente contra qualquer instituição que promovesse a destruição da vida. P 273

A exclusão do animal teve alguns efeitos sobre o homem, pois ele é dotado de certa dose de libido destinada ao relacionamento com a natureza e com os outros seres vivos. O costume moderno de ter animais de estimação é uma tentativa de satisfazer essa necessidade. Quando essa libido é reprimida no inconsciente, assume formas mais primitivas. Um exemplo disso é o instinto de formação de bandos, na psicologia de massa, agravado pelos imensos contingentes de habitantes apinhados em cidades. Grandes massas constelam o lado animal e grandes organizações são como bestas selvagens em busca de presas. A falta de respeito pelo “irmão animal” desperta o animal em nós. Para que uma verdadeira humanidade seja possível, é necessário que haja uma relação com os animais. Ao mesmo tempo, a libido para se relacionar com os animais ainda estava presente no homem, e produzia símbolos que apareciam nos sonhos. Como conseqüência, o aparecimento dos animais nos sonhos assumia um significado especial. Os sonhos de voar ou nadar, possivelmente, continham “depósitos raciais” das épocas em que nossos ancestrais animais haviam permanecido no mar. P 274

O que precisava era um equilíbrio entre a civilização e a animalidade: “O que precisava era um equilíbrio entre a civilização e a animalidade: “O excesso de animalidade distorce o homem civilizado, mas o excesso de civilização [Kultur] deixa os animais doentes” (§32). p 275

Na psicologia da personalidade, a linguagem dos instintos foi sendo progressivamente substituída por conceitos como necessidades, motivos e impulsos. ”Instinto, como substantivo, é uma palavra a ser evitada”, escreveu o psicólogo americano Henry Murray (que fora aluno de Jung), ... p 277

.Jung, (...), ele considerava a perda do contato com os instintos um sintoma da patologia da modernidade. P 284

“A vida do instinto, como o elemento mais conservador do homem, sempre se expressou em costumes tradicionais. Convicções e costumes muito antigos estão profundamente conectados com os instinto”. Quando as tradições se desfazem, a consciência torna-se desvinculada dos instintos e perde suas raízes. [...]. Assim, o inconsciente coletivo é cultural e politicamente conservador. P 284

A alienação contemporânea da pessoa em relação a seus instintos era exemplificada pela maneira como o homem moderno se identificava com seu conhecimento consciente de si mesmo, o qual era determinado por seu meio ambiente. (...). Nas sociedades contemporâneas, era o cidadão urbano quem mais estava distante dos instintos. P 285

O que estava claro era que a idéia de arquétipo tinha suplantado a idéia fatalista da mente como tabula rasa; daí em diante, tornava-se preciso então esclarecer o sentido dessa idéia. P 286

...a psique humana, à semelhança dos estratos da crosta terrestre ao longo dos séculos, recebia o depósito de numerosas gerações de seres humanos e influenciava as ações das pessoas contemporâneas, na forma de um inconsciente coletivo comum. P 286

Embora fosse perigoso para uma só pessoa satisfazer esses instintos, ser absorvida pela multidão permitia-lhe resolver isso, com toda a impunidade. Dos antropólogos evolutivos, Le Bom usou a equação do primitivo com o pré-histórico. As massas eram caracterizadas pelo contágio, e ninguém estava livre dessa influência arrabatadora: “Isolado, o indivíduo pode até ser culto; na massa, é um bárbaro”. P 309

Cada pessoa possui um inconsciente pessoal, cujos conteúdos são adquiridos ao longo da vida, juntamente com fatores psicológicos que também poderiam ser conscientes. Ao lado desses fatores, os indivíduos tinham em comum conteúdos coletivos. P 326

Jung chegou até a afirmar que “um dos maiores responsáveis pela desindividualização é o racionalismo científico natural,... p 366

JUNG, Carl Gustav. Memórias, sonhos, reflexões. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2006, 497p.

O sonho acrescentava à minha situação consciente que acabo de descrever outras camadas de consciência: [...]. Remontava, evidentemente, às bases da história das civilizações, que é uma história dos estados sucessivos da consciência. Descrevia, como um diagrama estrutural da alma humana (...) pela primeira vez, na existência de um a-priori coletivo da psique pessoal, a-priori que considerei primeiramente como sendo vestígios funcionais anteriores. Só mais tarde, quando minhas experiências se multiplicaram e meu saber se consolidou, reconheci que esses modos funcionais eram formas do instinto: os arquétipos. P 196

As imagens originais e a essência dos arquétipos passaram a ocupar o cnetro de minhas pesquisas; tornou-se evidente para min que não poderia existir psicologia, e muito menos psicologia do inconsciente, sem base histórica. P 245

Tive um sonho que, segundo meu sentimento, representava a súmula dessa experiência; estava habituado a viver sempre, simultaneamente, em dois planos: um, consciente, que queria compreender – e não conseguia – e o outro, inconsciente, que desejava se exprimir – e só fazia mediante o sonho. P 287

Mas por outro lado a infância tem a seu favor, devido à ingenuidade e inconsciência, o poder de esboçar uma imagem mais completa do si-mesmo, do homem total em sua individualidade autêntica. P 289

Quando viajo pela África a fim de encontrar um lugar psíquico exterior ao europeu, meu desejo inconsciente é encontrar em mim essa parte da personalidade, tornada invisível sob a influência e a pressão do fato de ser europeu. Essa parte está em oposição inconsciente ao que sou, porque não lhe concedo lugar. P 289

É a lembrança de uma possibilidade de vida ainda existente, mas mascarada pela civilização. Revivê-la em toda espontaneidade equivaleria a uma recaída na “barbárie”. Portanto, preferimos esquecê-la. Mas se ela voltar a nós sob a forma de um conflito, é preciso mantê-la na consciência e confrontar, uma com a outra, as duas possibilidades – a que vive e a que se esqueceu. Pois se não tivessem havido razões suficientes, o que parece esquecido não teria manifestado de novo. P 291

A viagem que realizei (...) ao Novo México, onde habitam os índios pueblos, (...). Era chefe dos pueblos Taos, homem inteligente, de quarenta e cinco anos. Chamava-se Ochwiay Biano – Lago das Montanhas. (...). “Veja”, dizia Ochwiay Biano, “como os brancos têm um ar cruel. (...). Os brancos sempre desejam alguma coisa, estão sempre inquietos, e não conhecem o repouso. Nós não sabemos o que eles querem. Não os compreendemos e achamos que são loucos!”. Perguntei-lhe então por que pensava que todos os brancos eram loucos. Respondeu-me: “Eles dizem que pensam com suas cabeças.” – Mas naturalmente! Com o que pensa você? – perguntei admirado. – Nós pensamos aqui – disse ele, indicando o coração. Caí numa profunda reflexão. Pela primeira vez na minha vida alguém me dera uma imagem do verdadeiro homem branco. (...) Esse índio encontrara nosso ponto vulnerável e pusera o dedo naquilo em que somos cegos. P 293

Era o bastante. Aquilo a que damos o nome de civilização, missão junto aos pagãos, expansão da civilização etc. tem uma outra face, a de uma ave de rapina cruelmente tensa, espreitando a próxima vítima, face digna de uma raça de larápios e de piratas. Todas as águias e outros animais rapaces que ornam nossos escudos heráldicos me parecem os representantes psicológicos apropriados de nossa verdadeira natureza. P 294

A anima do homem é carregada de um caráter eminentemente histórico. Como personificação do inconsciente é embebida de história e pré-história. Encerra os conteúdos do passado e substitui no homem o que ele deveria conhecer de sua pré-história. Toda a vida que foi no passado e que nele ainda vive constitui a anima. P 334

...os homens, hoje, se identificam freqüentemente apenas com a consciência e imaginam ser apenas aquilo que conhecem de si próprios. Ora, todo homem que de leve suspeita o que seja a psicologia poderá facilmente imaginar que este saber é muito limitado. O racionalismo e a doutrinação são doenças do nosso tempo; pretendem ter resposta para tudo. P 348



O homem deve provar que fez o possível para formar uma concepção ou uma imagem da vida após a morte – ainda que seus esforços sejam confissão de impotência. Quem não o fez, sofreu uma perda. Porque a instância interrogativa que fala nele é uma herança muito antiga da humanidade, um arquétipo, rico de uma vida secreta que desejaria juntar-se à nossa vida para perfazê-la. P 350

Os mitos são formas antiqüíssimas da ciência. Quando falo do que pode ocorrer depois da morte, estou sendo animado por uma emoção interior e não posso me valer senão de sonhos e de mitos. P 352

Se admitirmos que há uma continuação no “além”, só poderemos conceber um modo de existência que seja psíquico, pois a vida da psique não tem necessidade de espaço ou tempo. A existência psíquica – e sobretudo as imagens interiores de que nos ocupamos desde agora – oferecem matéria para todas as especulações míticas sobre uma vida no além, e esta eu a represento como um caminhar progressivo através do mundo das imagens. Desse modo a psique poderia ser essa existência na qual se situa o “além” ou o “país dos mortos”. Inconsciente e “país dos mortos” seriam, nessa perspectiva, sinônimos. P 369

Na velhice deixamos que as lembranças se desenrolem diante do olho interior e encontramo-nos a nós mesmos através das imagens interiores e exteriores do passado. É como se fosse o primeiro passo, uma preparação para a existência no além, da mesma maneira que, segundo a concepção de Platão, a filosofia é uma preparação para a morte. P 369-370

Tudo o que podemos dizer é que existe uma certa probabilidade de que alguma coisa se conserve além da morte física. P 372

O indivíduo, porém, é, em regra geral, de tal modo inconsciente, que não percebe suas possibilidades de decisão; por isso procura ansiosamente as regras e as leis exteriores às quais possa ater-se nos momentos de perplexidade. Abstração feita das insuficiências humanas, a educação é em grande parte a culpada por esse estado de coisas: ela procura suas normas exclusivamente no que é normal, e nunca se refere à experiência pessoal do indivíduo. P 380

...se bem que exista em muitos indivíduos modernos a possibilidade de um conhecimento profundo de si mesmo. Tal conhecimento é necessário, pois só em função dele pode-se atingir aquela camada profunda, aquele núcleo da natureza humana no qual se encontram os instintos. P 381

A melhor maneira do indivíduo se proteger do risco de confundir-se com os outros é a posse de um segredo que queira ou deva guardar. P 393

....ainda não se compreendeu que é tarefa do indivíduo ficar de pé, por si mesmo, e ser diferente dos demais. Todas as identidades coletivas, quer se refiram a organizações, profissões de fé relativas a tal ou qual ismo etc., ameaçam e se opõem ao cumprimento dessa tarefa. P 394

Assim como o iniciado, graças ao segredo da sociedade, não se marginaliza e participa de uma coletividade menos diferenciada, o indivíduo isolado tem necessidade, para caminhar solitário, de um segredo que, por qualquer motivo, não deva nem possa revelar. Tal segredo o obriga a isolar-se em seu projeto individual. Muitos indivíduos não podem suportar tal isolamento. São os neuróticos que brincam de esconde-esconde com os outros e consigo mesmo, sem se levar a sério, nem mesmo aos outros. Em regra geral, essas pessoas sacrificam sua meta individual à necessidade da adaptação social. P 395

O corpo tem uma pré-história anatômica de milhões de anos – o mesmo acontece com o sistema psíquico. P 400

As manifestações dos arquétipos repousam sobre precondicionamentos instintivos e nada têm a ver com a razão; além de não serem fundadas racionalmente, não podem ser afastadas por uma argumentação racional. Foram e são desde sempre partes da imagem do mundo, “representações coletivas” (...). O eu e sua vontade desempenham, certamente, em grande papel. P 405

O homem, como parte, não compreende o todo. Ele é subordinado a ele, está à sua mercê. Quer concorde ou se revolte, está preso ao todo, cativo dele. Depende dele, e sempre tem nele seu fundamento. P 407

Minha solidão começa com a experiência vivida em sonhos precoces e atinge seu ápice na época em que me confrontei com o inconsciente. Quando alguém sabe mais do que os outros, torna-se solitário. Mas a solidão não significa, necessariamente, oposição à comunidade; ninguém sente mais profundamente a comunidade do que o solitário, e esta só floresce quando cada um se lembra de sua própria natureza, sem identificar-se com os outros. P 410





ABRAHAM MASLOW


FADIMAN, James e FRAGER. Abraham Maslow e a psicologia transpessoal. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição

Na visão de Goldstein, todo organismo tem um impulso básico: “[O] organismo é governado pela tendência a realizar, tanto quanto possível, suas capacidades individuais, sua 'natureza' no mundo” (1939, p.196) p 388

Goldstein alegava que a liberação de tensão é um impulso forte, mas somente em organismos enfermos. Para um organismo saudável, o objetivo principal é “a formação de um certo nível de tensão, isto é, aquele que torna possível mais atividade ordenada” (1939, p. 195-196) p 388

Um impulso como a fome é um caso especial de auto-realização, em que se busca a redução de tensão para devolver o organismo à condição ideal para maior expressão de suas capacidades. Entretanto, somente em situação extrema esse impulso se torna opressor. P 388

...organismo auto-realizado saudável provoca esse choque por aventurar-se em novas situações a fim de utilizar suas capacidades. Para Goldstein (e também para Maslow), a auto-realização não livra o indivíduo de problemas ou dificuldades; pelo contrário, o crescimento pode trazer uma certa quantidade de dor e sofrimento. P 388

Maslow definia neurose e desajuste psicológico como doenças de deficiência; ou seja, elas são causadas pela privação de certas necessidades básicas, assim como a ausência de certas vitaminas causa doença. P 389

Viver no nível das necessidades superiores significa maior eficiência biológica, maior longevidade, menos enfermidade, melhor sono, apetite, etc. (Maslow, 1948) p 389

Segundo Maslow, necessidades mais básicas precisam ser satisfeitas antes que necessidades menos críticas sejam atendidas. P 389

Mais comumente, as pessoas auto-realizadas vêem a vida com clareza. Elas são menos emotivas e mais objetivas, menos tendentes a permitir que esperanças, medos ou defesas do ego distorçam suas observações. P 390

Um dos principais pontos de Maslow é que nós estamos sempre desejando alguma coisa e raramente alcançamos um estado de completa satisfação, sem metas ou desejos. Sua hierarquia de necessidades é uma tentativa de prever que tipos de desejos vão surgir quando os anteriores estiverem suficientemente satisfeitos e não dominarem mais o comportamento. P 390

Quando os queixosos se frustram por causa da imperfeição do mundo, da falta de justiça, e assim por diante, este é um sinal positivo, pois significa que, apesar de um alto grau de satisfação básica, as pessoas estão lutando por mais aperfeiçoamento e crescimento. P 391

A busca de satisfação das necessidades superiores é em si um indicador de saúde psicológica. Maslow afirma que a satisfação de necessidades superiores é intrinsecamente mais gratificante e que a metamotivação é uma indicação de que o indivíduo foi além do nível de funcionamento por deficiência
. P 398

ALFRED ADLER


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Alfred Adler e a psicologia individual. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição

O argumento de Adler de que as metas e experiências têm maior influência sobre o comportamento do que as experiências passadas foi um dos maiores motivos de seu rompimento com Freud. P 120

Meta de superioridade, ou conquista de seu ambiente. Ele enfatizou tanto o efeito das influências sociais sobre o indivíduo quanto a importância do interesse social. P 120

Em contraste com a maioria das outras teorias psicológicas abordadas neste livro, a psicologia individual não é uma psicologia profunda; ou seja, ela não pressupõe forças e constructos intangíveis profundos na psique. Adler desenvolveu uma psicologia de contexto, em que o comportamento é compreendido em termos do ambiente físico e social. P 120

Adler, que via a sexualidade como expressão de nossa personalidade e não como motivador fundamental, se opôs à asserção da primazia da libido. Ele sugeriu um impulso fundamental diferente, o impulso do poder. P 122

Segundo Adler, as tentativas iniciais das crianças de se adaptarem a seu ambiente podem resultar em sua escolha de dominar os outros como meio de adquirir auto-estima e obter êxito. P 123

Na verdade, um órgão fraco pode se desenvolver a ponto de tornar-se a maior força da pessoa. P 125

As crianças são relativamente pequenas e indefesas no mundo dos adultos. Para as crianças, controlar seu próprio comportamento e libertar-se da dominação dos adultos é um interesse primordial. Desta perspectiva, o poder é visto como o primeiro bem; e a fraqueza, como primeiro mal. O esforço para obtenção do poder é a primeira compensação da criança para o senso de inferioridade. Sentimentos moderados de inferioridade podem motivar o indivíduo para realizações construtivas. P 124

Os sentimentos de inferioridade não são em si anormais. Eles são a causa de todas as melhorias na posição da humanidade (Adler, 1956, p. 177) P 125

O desejo de crescer, de tornar-se tão ou mais forte do que todos os outros, surge em sua alma (Adler, 1928, p. 34) p 125

Para Adler, praticamente todo progresso é o resultado de nossas tentativas de compensar sentimentos de inferioridade. P 125

Adler afirmava que as tendências agressivas nos humanos foram cruciais na sobrevivência individual e na da espécie. P 125

Não tenha medo de cometer erros, pois não existe outro jeito de aprender a viver! (Adler, em Bottone, 1957, p. 37) p 125

A formação de metas de vida começa na infância como compensação para os sentimentos de inferioridade, insegurança e desamparo em um mundo adulto. As metas de vida geralmente servem como defesa contra sentimentos de impotência, como uma ponte do presente insatisfatório para um futuro brilhante, poderoso e satisfatório. P 126

Estilo de vida é o modo especial escolhido por um indivíduo para perseguir sua meta de vida. P 127

Hábitos e traços de comportamento aparentemente isolados adquirem significado como elemento do estilo de vida e metas do indivíduo, e assim os problemas psicológicos e emocionais devem ser tratados dentro deste contexto. P 127

Adler enfatiza que é nossa concepção do mundo que determina o comportamento. P 127

A gente encontra o que planeja encontrar. (Adler, 1964b, p. 100) p 127

Cada indivíduo, segundo Adler, tem um centro onde é livre. Uma vez que somos livres, somos responsáveis por nossas ações e por nossa vidas. P 128

O comportamento se baseia em nossa percepção da realidade, não necessariamente na própria realidade. Para compreender o indivíduo, é preciso entender seu estilo de vida. P 130

A luta construtiva por superioridade, acrescida de forte interesse social e cooperação, é o traço básico do indivíduo. P 131

Os traços de crianças não amadas sua forma mais desenvolvida podem ser observados estudando-se as biografias de todos os grandes inimigos da humanidade. Aqui o que se destaca é que, quando crianças, eles desenvolveram dureza de caráter, inveja e ódio; eles não suportariam ver os outros felizes (Adler, 1956, p. 371) P 132

Quando os sentimentos de inferioridade predominam ou quando o interesse social é pouco desenvolvido, os indivíduos tendem a buscar superioridade pessoal, pois carecem de confiança em sua capacidade de funcionar efetivamente e de trabalhar construtivamente com os outros. Os ornamentos do sucesso, prestígio e estima tornam-se mais importantes do que as realizações concretas. “Eles se afastaram dos reais problemas da vida e estão envolvidos numa luta imaginária para renovar sua confiança em sua força” (Adler, 1956, p. 255) p 133

Só podemos ter êxito se estivermos genuinamente interessados no outro. Devemos ser capazes de ver com seus olhos e ouvir com seus ouvidos. (Adler, 1929, p. 340) p l35

Eu digo (aos pacientes): “Você pode se curar em duas semanas se seguir esta receita. Tente pensar todos os dias em como pode agradar alguém”. (Adler, 1956, p. 347) p 136

As principais contribuições de Adler à psicologia moderna são a importância de fatores não-sexuais no ambiente, o conceito de unidade da personalidade, o papel do poder e da agressividade no comportamento humano, e o conceito do complexo de inferioridade. P 138

MELANIE KLEIN - DONALD WINNICOTT - HEINZ KOHUT - FRITZ PERLS


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Anna Freud e os pós-freudianos. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição.


DONALD WINNICOTT

Se o bebê deseja ser alimentado, e a mãe oferece o seio ou a mamadeira no momento certo; se o bebê sorri, e a mãe sorri de volta como validação; se o bebê fica úmido e chora, e a mãe responde trocando a fralda, então o bebê irá construir a noção de que suas expressões espontâneas são eficazes. P 71

Quando a onipotência do bebê é respeitada, desenvolve-se um verdadeiro self; entretanto, quando não se sente eficiente, a criança se sente desamparada e tende a se adaptar às necessidades da mãe a fim de obter o que deseja. Nesse caso, ela desenvolve um falso self. P 71

Ele viu que o relacionamento psicanalítico era uma repetição do primeiro relacionamento da criança – ou seja, com sua mãe. P 72

Era necessário, pensava ele, atender as necessidades do paciente, em vez de forçar o paciente a ajustar-se aos horários e necessidades do analista. Isso só iria reforçar um falso self no paciente. P 72

Acima de tudo, é a correspondência empática e satisfação das necessidades do verdadeiro self do paciente o objetivo durante a psicanálise. P 72

COSTA PINTO, Manoel da. D. W. Winnicott: o homem e a obra. In: O Livro de ouro da psicanálise. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007, 540 p.

Teoria do Desenvolvimento, com um estudo pormenorizado da relação mãe-filho e das influências da família e do ambiente, postulando a interação de processos inatos de maturação com a presença de um ambiente facilitador, desde uma fase de dependência absoluta à independência humana. P 399

Winnicott escreveu que não existe um bebê se não houver uma mãe e, conseqüentemente, não pode existir uma mãe sem um pai, ainda que no imaginário da mãe e referido, eventualmente, ao próprio pai da mãe. Considero que a mãe só poderá exercer a preocupação materna primária se houver um pai suficientemente bom. P 401

COSTA PINTO, Manoel da. Constituição do si-mesmo e transicionalidade. In: O Livro de ouro da psicanálise. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007, 540 p.

Foi o trabalho analítico com esses pacientes, (...) de aproximadamente 60 mil crianças e suas mães (ele veio da pediatria), que permitiu a Winnicott formular um estado de não-separação inicial mãe-bebê, na fase de dependência absoluta da criança em relação aos cuidados maternos. Do seu ponto de vista só nos tornamos pessoa em virtude da relação com ouyra pessoa, como é o caso da relação mãe-bebê nos primórdios da vida. P 406

...o ser só é possível com outro ser humano. Durante esta fase, a continuidade do ser é o sentimento que resulta da fusão da mãe suficientemente boa com o bebê. P 407

Quando ocorre um fracasso materno, temos as invasões que provocam reações por parte do bebê. [...]. Invasões intensas e reiteradas levam à sensação de aniquilação do self e defesas do tipo falso self que encapsulam o núcleo do verdadeiro self. O indivíduo se desenvolve, agora, a partir da casca defensiva, com referencial alheio ao seu ser. P 407

“Para mim, o self, que não é o ego, é a pessoa que eu sou, que é somente eu, que possui uma totalidade baseada na operação do processo maturativo. Ao mesmo tempo, o self tem partes e é, na verdade, constituído dessas partes. Tais partes se aglutinaram num sentido interior-exterior no curso do processo maturativo, auxiliado, como deve sê-lo (principalmente no início), pelo ambiente humano que o contém, que cuida dele e que de forma ativa o facilita. P 409-410


COSTA PINTO, Manoel da. A devotada e seu bebê. In: O Livro de ouro da psicanálise. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007, 540 p.

Quando o cuidado materno mostra-se confiável, a “continuidade da linha da vida” do bebê se mantém, e ele experimente uma “continuidade de ser”, pois os processos de desenvolvimento de seu ego não sofreram excessivas perturbações emocionais ou físicas. Essa é a “base do ego”. P 423

As invasões do meio ambiente por falhas da mãe confiável constituem um trauma, pois levam o bebê a reagir ao ambiente, antes de ter conseguido desenvolver mecanismos psíquicos que possibilitam tornar previsível, isto é, antes que o bebê possa ter condições de considerar o que é bom ou mau no ambiente, como projeção sua. [...]. Num estágio posterior, com o ego mais desenvolvido, a criança passa a ser capaz de sentir raiva devido à falha de adaptação ambiental... p 424

Caso o meio ambiente não adaptado persista, maiores e mais intensas serão as reações do bebê. A hiperatividade da mente não consegue mais compensar as invasões do mio ambiente, ocorrendo estados confusionais ou deficiência mental aparente (sem lesão orgânica). P 427

Com base nos trabalhos de Freud e Melanie Klein, Winnicott considerava que a morte ou desaparecimento da mãe coloca a criança à mercê do ódio e da ambivalência, por predomínio de elementos persecutórios, que enfraquecem as forças benignas e amorosas. P 432


HEINZ KOHUT

Ele reconheceu que nosso narcisismo inato é parte essencial do desenvolvimento do self e que os processos narcisistas são essenciais durante todo o nosso desenvolvimento. P 72

Ele descobriu que a escuta empática profunda, e não a interpretação, era a chave para a cura. Na verdade, a interpretação, a intervenção psicanalítica tradicional, para o desenvolvimento do ego, só piora as coisas para o self. P 73

Todos nós conhecemos pessoas que só conversam sobre si mesmas ou sobre suas experiências, sem dar importância aos pensamentos ou sentimentos dos outros. P 73

O primeiro espelhamento, em que o bebê olha para a mãe e vê o seu próprio self refletido no olhar de prazer dela. No relacionamento de espelhamento, é como se o bebê dissesse a si mesmo: “Você vê o maravilhoso eu. Logo, eu sei que sou maravilhoso”. P 73

O segundo processo narcisista normal é a idealização, que começa quando a criança reconhece o genitor ou outra pessoa especial. Aqui as qualidades internas de seu próprio self – bondade, perfeição, onipotência, significado, um sentimento de realidade, etc. – são projetadas sobre esta pessoa de modo que a criança poderia dizer: “Eu vejo e estou próximo ao maravilhoso você; logo, eu existo e sou maravilhoso também”. Tanto na relação objetal de espelhamento quanto na idealização, a criança conhece o seu self com o auxílio do outro. P 73

Kohut chamou estas pessoas do espelhamento e idealização de objetos-do-self (Kohut, 1977) porque a criança os sente como uma extensão de si mesma. P 73

O processo interno de espelhamento conduz a ambições realistas no mundo apoiadas pelo elogio encorajador internalizado da mãe. De modo semelhante, quando o pai idealizado foi internalizado, a criança pode esforçar-se por ideais realistas. Estes dois pólos constituem o núcleo de um self saudável e geram as ambições e ideais profundamente sentidos que fornecem um sentido de propósito e significado. P 73

Entretanto, se ambos falham, os sintomas com os quais Kohut está preocupado – sentir-se irreal, vazio e sem significado – sobrevirão, pois não existe estrutura interna de self que possa produzir sentimentos de valor próprio. P 73


FRITZ PERLS

Fritz Perls sugeriu que qualquer aspecto do comportamento de um indivíduo pode ser visto como uma manifestação do todo – o ser da pessoa (F. Perls, 1978). Na terapia, por exemplo, o que o paciente faz – como ele se movimenta, fala, e assim por diante – fornece tanta informação quanto o que ele pensa e diz. Nossos corpos são representações diretas de quem somos. Pela simples observação de nossos comportamentos físicos facilmente visíveis e de nossa postura – respiração, movimentos -, podemos aprender muitíssimo sobre nós mesmos. P 76

Os neuróticos são incapazes de viver no presente. Eles cronicamente carregam consigo “questões pendentes” do passado. Uma vez que sua atenção se concentra no que não está resolvido, eles não possuem consciência nem energia para lidar plenamente com o presente. P 76

Fritz Perls via os sonhos como mensagens sobre situações inacabadas, incluindo o que estamos perdendo em nossas vidas, o que estamos evitando fazer... P 79

MELANIE KLEIN

Klein aprofundou a descoberta de Freud de que a agressividade e o amor atuam como forças organizadoras fundamentais na psique. A agressão divide a mente, enquanto o amor a une. P 69

Nossas experiências com pessoas importantes, tais como nossos pais ou primeiros parceiros românticos, tornam-se interiorizadas e depois estruturam nossa experiência não apenas dos outros, mas também de nossa própria identidade. Por exemplo, quando “cindimos” o mundo em bom e mau, também dividimos o nosso sentido de “eu” em aspectos de temor e desejo. P 70



COSTA PINTO, Manoel da. Significado de Melanie Klein. In: O Livro de ouro da psicanálise. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007, 540 p.

Sua apreensão do mundo interno infantil e das formas por meio das quais as emoções ali adquirem significado contribuiu para o entendimento da personalidade adulta, com seus núcleos infantis incrustados que persistem por toda a vida. P 222

Klein considera que a estrutura arcaica das emoções infantis, muitas vezes datada de um período pré-verbal, persiste ao longo de nossas vidas e interfere na mente adulta. P 222

“Sentir os pais como se fossem pessoas vivas dentro de seu corpo da mesma maneira concreta que profundas fantasias inconscientes são vividas. Isto é, se esses pais 'internos' se amam, se vivem em harmonia, desse mundo interior brota, de forma viva, um princípio de ordenação que ajuda a transformar o caos interior em cosmos. Por outro lado, se estão em guerra, em litígio, o caos se adensa e se aprofunda.” P 223

A mãe, ou sua representação parcial como seio alimentador, se constitui nesse sentido no primeiro objeto interno do bebê, podendo adquirir qualidades boas ou más, conforme a função exercida. P 223

Quando esta mãe a satisfaz, atendendo-a, contendo sua ansiedade, ela é internalizada como objeto bom, capaz de compreendê-la, cuidar dela e se forma fonte de segurança. P 224

Não apenas o passado histórico e as repressões acumuladas durante a vida que se tornam parte de nossa subjetividade e a perturbam. Antes mesmo da formação do ego e do superego do bebê, já existiria uma força negativa (pulsão de morte) atuando, gerando defesas contra ansiedades iniciais, que vão, aos poucos, se corporificado em estruturas. P 224




COSTA PINTO, Manoel da. A açougueira inspirada: O Livro de ouro da psicanálise. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007, 540 p.

...pode-se afirmar que as noções de “objeto externo” e de ‘realidade externa”, para Klein, referem-se à realidade tal como é percebida pelo sujeito, com as influências maiores ou menores das fantasias inconscientes. P 304

Talvez seja necessário, para entender o pensamento Kleiniano, que nos situemos num mundo que uma vez já foi o nosso, mas que por “crescimento” tivemos de “esquecer”. Crescimento e esquecer entre aspas porque nem de fato crescemos a ponto de não mais habitarmos em parte aquele mundo nem o esquecemos a ponto de não o reconhecermos aqui e ali, principalmente em nossos momentos mais intensos de angústia, odeio, amor, destrutividade, paixão e violência. Trata-se de um mundo “antes do mundo”, do despedaçamento daquilo que na realidade ainda está por se constituir, do amor e do ódio como sensações, de um pré-pensamento antes do pensamento, do prazer e do sofrimento inomináveis. P 305

Há uma canção de Chico Buarque e Milton Nascimento que fala sobre aquilo “que não tem medida, nem nunca terá”, nossas onipotentes e desmedidas paixões – amor, ciúme, controle, posse, ambição, inveja, raiva -, com seu caráter indomável, ilimitado e insaciável: “que não tem governo, nem nunca terá”. É um mundo de desejos que disparam à nossa revelia e ameaçam ultrapassar-nos, transbordando. Diante da autonomia dos “quereres” inconscientes, vindos de outro lugar e que nos marginalizam em relação àquele nosso “eu” mais bem comportado... p 307

O infantil é uma dimensão fora do tempo, um fundo ameaçador, dada a imensidão de sua demanda. Idioma primitivo que ainda não aprendeu a falar (infans quer dizer “o que não fala”) , faz um apelo de acesso à figuração, quer se formular a todo custo, quer se revelar. Existe no mais inconsciente recesso, secreto, pulsante, em todos os processos psíquicos e em todas as idades. P 308
A pulsão de vida expressa o investimento de amor: conduz ao movimento de colocar libido e interesse nas pessoas e no mundo. Do outro lado, a pulsão de morte corresponde à tendência mortífera de narcisismo, isto é, o apagamento e a dissolução de si e da importância e significado das outras pessoas; é a tendência a desprezar os outros, a tornar-se indiferente, a anestesiar a sensibilidade e a percepção das emoções, a embrutecer-se e fechar-se. P 309

Tirar o valor das outras pessoas, desprezá-las, revela o medo de sofrer e, como se sabe, “quem desdenha, quer comprar”. O alvo para o qual se dirige a inveja é o bom, o belo, o admirável dom de um artista, por exemplo. A inveja quer a posse imaginária da criatividade, da aptidão que a outra pessoa tem para gerar, daquilo que há de mais secreto e singular em cada um.... p 310

É uma autora que nos convida a deixar de lado nossos preconceitos estéticos e a necessidade de uma bela teoria e fazermos com ela precisamente isto: um movimento de rebaixamento, (...). “Rebaixar consiste em aproximar da terra, entrar em comunhão com a terra concebida como um princípio de absorção e, ao mesmo tempo, de nascimento [...] significa entrar em comunhão com a vida da parte inferior do corpo, a do ventre e dos órgãos genitais, e portanto, com atos como o coito, a concepção, a gravidez, o parto, a absorção de alimentos e a satisfação das necessidades naturais. P 311




COSTA PINTO, Manoel da. A música da fala. In: O Livro de ouro da psicanálise. Rio de Janeiro: Ediouro, 2007, 540 p.

...o ser humano nasce para um mundo de relações e, desde o início, quando se relaciona com alguém, nunca mais será o mesmo. A partir do momento em que ocorre uma experiência emocional, todo relacionamento implica uma modificação de todos que nelas estão presentes. P 320

O mecanismo da identificação projetiva está presente desde o nascimento e tem como base a fantasia de que certos aspectos do self estão situados fora dele, dentro do próprio objeto, de maneira que tenha a sensação de controlar o objeto desde dentro e que o projetor vivencie o objeto como parte dele mesmo. P 322

O desenvolvimento do ego ocorre mediante a introjeção de objetos que, quando integrados, são assimilados dentro do ego e sentidos como pertencentes a ele, sendo, em grande parte, também estruturado por esses objetos. P 322

Segundo a teoria Kleiniana, os fenômenos transferenciais são concebidos como externalização, no presente, do mundo interno. “Os neurótico já não são considerados seres que 'sofrem de reminiscências', mas pessoas que vivem no passado, representando pelas qualidades do presente imediato do mundo interno”, diz Meltzer. P 324

Ela descreveu o desenvolvimento do psiquismo como uma elaboração do conflito entre os impulsos de vida e de morte, com as pulsões de vida prevalecendo gradualmente sobre as destrutivas. Para ela, o conflito entre as pulsões de vida e pulsões de morte é o motor de todo o acontecer psíquico. P 327

Melanie Klein descreveu como os impulsos agressivos podem ser um instrumento para lidar com o desamparo que todo ser humano enfrenta no início da vida. P 328

Melanie Klein humanizou a psicanálise. Mostrou que é a emoção que dá significado e cor às experiências de vida. (...) os seres humanos vivem duas realidades, a externa e a interna, evidenciou quão necessário é o sentido da realidade psíquica, que seria a pessoa reconhecer e assumir responsabilidades pelos próprios impulsos e pelo estado de organização de sua mente. P 328

SIGMUND FREUD


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Sigmund Freud e a Psicanálise. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição.

Os sintomas dos pacientes histéricos dependem de cenas marcantes, porém esquecidas de suas vidas (traumas) ... p 30

Ele afirmava que nada ocorre casualmente, muito menos os processos mentais. Existe uma causa, até múltiplas causas, para todo pensamento, sentimento, memória ou ação. Todo evento mental é ocasionado por intenção consciente ou inconsciente e é determinado pelos eventos que precederam. p 33

No inconsciente existem elementos instintuais, que nunca foram conscientes e que nunca são acessíveis à consciência. p 33

“Sabemos por experiência que os processos mentais inconscientes são em si 'atemporais'. Isso significa dizer, para começar, que eles não são cronologicamente organizados, o tempo não os altera em nada, e tampouco a idéia de tempo pode-lhes ser aplicada”. p 33-34

A suposição de que o corpo é a única fonte de toda a energia mental subjaz todo o pensamento de Freud. Ele ansiava pelo dia em que todos os fenômenos mentais pudessem ser explicados com referência direta à fisiologia cerebral (Sulloway, 1979). p 33

Pulsões são pressões para agir sem pensamento consciente para determinados fins. Estas pulsões são “a causa fundamental de toda atividade” (Freud, 1940, p 5). Freud chamava os aspectos mentais de “desejos”. Necessidades e desejos impelem as pessoas a agir. p 34

O alvo é reduzir a necessidade até que a ação não seja mais necessária, isto é, dar ao organismo a satisfação que agora deseja. A pressão é a quantidade de energia, força ou ímpeto utilizada para satisfazer ou gratificar a pulsão. p 34

Pulsões básicas. Freud elaborou duas descrições das pulsões básicas: (...) a sexual (...) e a agressiva ou destrutiva. p 34

O desejo sexual, por exemplo, pode ser aliviado através da atividade sexual, ou também assistindo a filmes eróticos, observando imagens, lendo sobre outras pessoas, fantasiando, comendo, bebendo – até mesmo se exercitando. p 34

Cada uma dessas pulsões generalizadas tem uma fonte distinta de energia. A libido (termo latino para desejo) é a energia disponível às pulsões de vida. p 35

A energia agressiva, ou pulsão de morte, não tem uma denominação especial. Supõe-se que ela tem as mesmas propriedades gerais da libido. p 35

Catexia é o processo pelo qual a energia libidinal disponível na psique é concentrada ou investida em pessoa, idéia ou coisa. A libido que foi catexiada não é mais móvel e não pode se deslocar para novos objetos. p 35

Os conteúdos do Id são quase totalmente inconscientes. Eles incluem pensamentos primitivos que jamais foram conscientes e pensamentos que foram negados, considerados inaceitáveis à consciência. Segundo Freud, experiências que foram negadas ou reprimidas ainda possuem a capacidade de afetar o comportamento da pessoa com a mesma intensidade, sem estarem sujeitas ao controle inconsciente. p 36

O ego é a parte da psique que está em contato com a realidade externa. p 36

O superego desenvolve, aperfeiçoa e mantém o código moral de um indivíduo. “O superego de uma criança, na verdade, se constrói sobre o modelo, não de seus pais, mas do superego de seus pais; os conteúdos que o preenchem são os mesmos, e isso torna-se o veículo da tradição (...), as quais se propagaram dessa forma de geração para geração” (1993, p 39). Portanto, a criança aprende não apenas os reais limites em qualquer situação, mas também as visões morais dos pais. p 37

O objetivo primordial da psique é manter – e quando necessário, recuperar – um nível aceitável de equilíbrio dinâmico que maximize o prazer da redução de tensão. A energia que é utilizada se origina no id impulsivo primitivo. O ego existe para lidar realisticamente com as pulsões básicas do id. Ele também intermedeia as demandas do id, as restrições do superego e a realidade externa. p 37

Os sonhos são um equilíbrio parcial, tanto física quanto psicologicamente, entre anseios instintuais e limitações da vida real. Sonhar é um modo de canalizar desejos insatisfeitos, através da consciência, sem despertar o corpo físico. P 43

Quase todos os sonhos podem ser compreendidos como a realização de um desejo. O sonho é uma rota alternativa para satisfazer os desejos do id. P 43

Para o id, não importa se a satisfação ocorre na realidade física sensória ou na realidade onírica interna imaginária. Em ambos os casos, energias são descarregadas. P 43

“Na maioria dos modelos americanos nativos, não existe separação distinta entre o mundo sonhado e o mundo vivido (...)” (Krippner e Thompson, 1996). P 44

As interações e os relacionamentos adultos são grandemente influenciados pelas primeiras experiências da infância. As primeiras relações, aquelas que ocorrem dentro da família nuclear, são freqüentemente definidoras. Todos os relacionamentos posteriores são influenciados pelos modos como essas primeiras relações se formaram e se mantiveram. Os modelos básicos entre criança e mãe, criança e pai e criança e irmão são os protótipos segundo os quais os contatos subseqüentes são inconscientemente avaliados. Os relacionamentos posteriores são, até certo ponto, recapitulações das dinâmicas, tensões e gratificações que ocorrem na família de origem. P 45

Repetidas vezes representamos a dinâmica iniciada em nossos lares, freqüentemente escolhendo como parceiros pessoas que reinvocam em nós aspectos não-resolvidos de nossas primeiras necessidades. P 45

Nossas escolhas de ida – de amores, amigos, chefes, até de nossos inimigos – são derivados dos laços entre pais e filhos. P 45

Os relacionamentos são construídos sobre uma base de efeitos residuais das intensas experiências iniciais. Os encontros amorosos de adolescentes, jovens adultos e adultos, bem como os padrões de amizade e casamento, são, em parte, uma reelaboração de questões infantis não resolvidas. P 46

O que Freud desvelou, em uma era que havia venerado a razão e negado o valor o poder da emoção, foi que não somos animais predominantemente racionais, mas somos conduzidos por forças emocionais poderosas, cuja gênese muitas vezes é inconsciente. As emoções são as vias de liberação da tensão e apreciação do prazer. P 46

Respostas emocionais fortes podem, na verdade, encobrir um trauma de infância. P 46

Muitas de suas idéias, tais como a importância dos sonhos e a vitalidade dos processos inconscientes, são amplamente aceitas. P 49

Aqueles que optam por estudar a mente ou tentam compreender os outros seres humanos devem fazer as pazes com as idéias básicas de Freud através de um exame de sua própria experiência interior. P 50

Freud sugere que todo comportamento está vinculado, que não existem acidentes psicológicos – que sua escolha de pessoas, lugares, alimentos e diversões provém de experiências das quais você ou não se recorda ou não irá se recordar. Todo pensamento e todo comportamento possui significado. P 50

...sua lembrança ou sua versão de seu próprio passado contém pistas de como você se comporta e de quem você é. P 50















KAREN HORNEY


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Karen Horney e a psicanálise humanística. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição

Horney via a característica central da neurose como alienação do eu real por causa de forças opressivas no ambiente. P 153

Outra diferença importante entre Horney e Freud é que, enquanto para Freud as experiências decisivas da infância são relativamente poucas e em sua maioria de natureza sexual, para Horney o somatório das experiências da infância é responsável pelo desenvolvimento neurótico. As coisas dão errado em função de todos os eventos e indivíduos na cultura, nas relações com os pares e especialmente na família, que fazem a criança se sentir insegura, desamada e sem valor e que dão origem à ansiedade básica. P 153

Horney via a característica central da neurose como alienação do eu real por causa de forças opressivas no ambiente. P 153

As pessoas podem se realizar de diferentes maneiras sob diferentes condições, mas existem certas condições na infância de que todos necessitam para a auto-realização. Estas incluem “uma atmosfera de afetuosidade”. P 153-154

Quando suas próprias neuroses impedem os pais de amar a criança ou até de pensar “nela como o indivíduo particular que ela é”, a criança desenvolve um sentimento de ansiedade básica que a impede “de relacionar-se com os outros com a espontaneidade de seus sentimentos reais”, forçando-a a desenvolver estratégias defensivas (1950, p. 18) p 154

Segundo Horney, os indivíduos tentam lidar com sua ansiedade básica adotando uma solução de conformidade ou submissão, aproximando-se das pessoas, adotando uma solução agressiva ou expansiva, indo contra as pessoas, ou tornando-se indiferentes ou resignadas, afastando-se das pessoas. As pessoas saudáveis se conduzem de maneira apropriada e flexível em todas as três direções, mas no desenvolvimento neurótico estes movimentos se tornam compulsivos e indiscriminados. P 154

É a solução no qual o alheamento é a solução predominante (...). Eles lidam com um mundo ameaçador afastando-se de seu poder e excluindo os outros de suas vidas interiores. Para evitarem ser dependentes do ambiente, tentam subjugar seus anseios interiores e contentar-se com pouco.(...). Seu acordo é que se não pedirem nada aos outros, estes não os pertubarão; se não tentarem nada, não irão falhar; se esperarem pouco da vida, não irão se decepcionar. P 156

A neurose é uma perturbação não apenas de nossos relacionamentos com os outros, mas também de nosso relacionamento com nós mesmos. P 159

A libertação do eu real do vaivém do sistema de orgulho é, sugiro, um triunfo do comum (...). Simplesmente sendo ela mesma com todas as suas capacidades e falhas, uma pessoa compreende que não precisa ser extraordinária para ter valor. (Westkott, 1986, p. 211) p 159

A esperança de Horney é que os pacientes “sintam-se solidários” consigo mesmos e experimentem a si mesmos “como não sendo particularmente maravilhosos ou desprezíveis, mas como seres humanos lutadores e muitas vezes atormentados” que são (1950, p. 359) p 159

Os terapeutas podem ajudar seus pacientes a formular e esclarecer informações, mas os pacientes devem fornecê-las revelando-se a si mesmos. P 161

Para Horney, o objetivo da terapia é ajudar os pacientes a abandonarem suas defesas, aceitarem-se como são, e substituírem sua busca de glória por uma luta de auto-realização. P 161

Em The feminist legacy of Karen Horney (1986), Marcia Westkott explorou as implicações da teoria madura de Horney para a psicologia feminina, com capítulos sobre sexualização e desvalorização das mulheres e a dependência, cólera e alheamento que sentem como conseqüência. (...) “um contexto histórico em que as mulheres são menos valorizadas do que os homens” (WestKott, 1986, p. 2). Ela sugeriu que estes traços são reações defensivas à subordinação, desvalorização e impotência e que, por mais que pareçam indesejáveis do ponto de vista social, são desfavoráveis à auto-realização das mulheres. P 164

Horney duvidava que a infância pudesse ser acuradamente recuperada, uma vez que necessariamente a reconstruímos da perspectiva de nossas necessidades, crenças e defesas presentes. P 165

Ódio de si próprio. A raiva que o eu idealizado sente em relação ao eu que realmente somos por este não ser o que “deveria” ser. P 168

ERIK ERIKSON


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Erik Erikson e o ciclo de vida. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição

O modelo dos estágios de desenvolvimento humano de Erkson – modelo por ele denominado epigenético – é a primeira teoria psicológica a descrever o ciclo de vida humano da infância à idade adulta e velhice. P 199

Epigênese sugere que cada elemento se desenvolve sobre as outras partes (epi significa “sobre” e gênese significa “surgimento”). P 199

O aparecimento de cada estágio sucessivo baseia-se no desenvolvimento do estágio anterior. P 199

Cada estágio se caracteriza por uma tarefa de desenvolvimento específica, ou crise, que deve ser resolvida para que o indivíduo avance para o estágio seguinte. As virtudes e capacidades desenvolvidas através da bem-sucedida resolução em cada estágio afetam toda a personalidade. Elas podem ser influenciadas por eventos posteriores ou anteriores. Entretanto, estas capacidades psicológicas geralmente são afetadas mais fortemente durante o estágio em que aparecem. P 199

Cada estágio é uma crise de aprendizagem, permitindo a realização de novas habilidades e atitudes. A crise pode não parecer dramática ou crítica; muitas vezes a pessoa só consegue ver posteriormente que um importante ponto de virada foi alcançado e ultrapassado. P 199

Erikson assinalou que a resolução bem-sucedida da crise em cada estágio de desenvolvimento humano promove uma certa virtude psicossocial. A palavra virtude é utilizada em seu sentido antigo, como na virtude de um medicamento. P 199

Os bebês controlam e criam os pais tanto quanto são controlados por eles (Erikson, 1963, p. 69) p 199

Quando os bebês começam a vida, eles desenvolvem um relativo senso de confiança e desconfiança no mundo a sua volta. Crucial para este equilíbrio entre segurança e insegurança é a experiência do bebê com a mãe. P 200

O senso de confiança se desenvolve não tanto com o alívio da fome ou com demonstração de amor mas com a qualidade da atenção materna. P 201
Um senso de autonomia se desenvolve com o senso de livre escolha. Ele é promovido pelo sentimento de ser capaz de escolher o que guardar e o que rejeitar. P 201

A nova liberdade e a afirmação de poder da criança quase inevitavelmente criam ansiedade. A criança desenvolve uma consciência, uma atitude parental que favorece a auto-observação, o autogoverno, e a punição de si própria. Neste estágio, a criança pode fazer mais do que nunca e precisa aprender a definir limites. P 202

O adulto já foi uma criança e um jovem. Ele jamais os será novamente; mas ele tampouco ficará sem a herança destas condições pregressas. (Erikson, 1987, p. 332) p 203

Quando termina a infância, os adolescentes entram neste estágio (...). Eles questionam os modelos de papel e as identificações da infância e experimentam novos paéis. A grande pergunta deste estágio é “Quem sou eu?”. Desenvolve-se um novo senso de identidade do ego. P 203

Dúvidas quanto à atratividade sexual e identidade sexual também são comuns. A incapacidade de “segurar” e desenvolver um sentimento de identidade com um indivíduo ou modelo de papel cultural que ofereça inspiração e orientação pode provocar um período de atrapalhação e insegurança. Outra reação comum é a identificação excessiva (ao ponto de aparentemente perder a identidade) com heróis da cultura jovem ou com líderes de grupos fechados. A pessoa muitas vezes sente-se isolada, vazia, ansiosa ou indecisa. Com a pressão para tomar importantes decisões de vida, o adolescente sente-se incapaz de tomá-las e até resiste a isso. P 204

Intimidade versus isolamento. Este estágio geralmente ocorre no início da idade adulta. É a época de adquirir um senso de independência dos pais e da escola, de estabelecer amizades e relacionamentos íntimos e de desenvolver a noção de responsabilidade adulta. P 204

Somente depois de termos estabelecido um senso relativamente estável de identidade é que podemos desenvolver um relacionamento próximo e significativo com outra pessoa. P 204

Integridade versus desespero. O estágio final da vida chega com a velhice. (...). Se não adquirimos uma medida de auto-aceitação, tendemos a mergulhar no desespero com o sentimento de que o tempo é curto- curto demais para recomeçar. Aqueles que terminam em desespero podem ficar amargurados com o que poderia ter sido, constantemente lamentando-se. P 205

A virtude da sabedoria se desenvolve a partir dos encontros tanto com a integridade quanto com o desespero, à medida que o indivíduo é confrontado com preocupações fundamentais. (...). A sabedoria mantém a integridade do conhecimento e experiência que o indivíduo acumulou. P 206

WILHELM REICH


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Wilhelm Reich e a psicologia somática. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição

Couraça do caráter. Reich achava que a estrutura de caráter se forma como defesa contra a ansiedade da criança em torno de sensações sexuais intensas e o medo de punição que as acompanha. P 226

As defesas de caráter são difíceis de erradicar porque são racionalizadas pelo indivíduo e sentidas como parte de seu auto-conceito. P 227

A couraça é o principal obstáculo para o crescimento, segundo Reich. P 231

O organismo encouraçado é incapaz de destruir sua própria couraça. Mas ele é incapaz de expressar suas emoções biológicas elementares. (...). O indivíduo encouraçado não consegue expressar um suspiro de prazer ou conscientemente imitá-lo. Quando ele tenta fazê-lo, o resultado é um gemido, um urro contido e suprimido, ou até um impulso para vomitar. Ele é incapaz de dar vazão à raiva ou de bater o punho para imitar cólera. P 231

Outro obstáculo para o crescimento é a repressão social e cultural dos impulsos naturais e da sexualidade do indivíduo. A repressão, afirmou Reich, é a maior fonte de neurose... p 231

Na visão de Reich, os relacionamentos sociais são determinados pelo caráter do indivíduo. A maioria das pessoas vêem o mundo através do filtro de sua couraça, o que as isola tanto de suas naturezas interiores quanto de relacionamentos sociais satisfatórios. Somente pessoas de caráter genital, por terem perdido sua couraça rígida, podem reagir aberta e honestamente aos outros. P 232

Natureza e cultura, instinto e moralidade, sexualidade e realização tornam-se incompatíveis como fruto da cisão na estrutura humana. A unidade e congruência entre cultura e natureza, trabalho e amor, moralidade e sexualidade, almejada desde os mais remotos tempos, continuará sendo um sonho enquanto o homem continuar condenando a necessidade biológica de gratificação sexual (orgástica) natural. P 232

Ele definia caráter quase exclusivamente em termos de couraça. “O caráter atua para produzir uma resistência (...). Para ele [Reich], o caráter é uma couraça que se forma através do endurecimento crônico do ego. O significado e propósito desta couraça é a proteção de ameaças internas e externas” (Sterba, 1976, p. 278) p 234

ANA FREUD


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Anna Freud e os pós-freudianos. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição.

Defesas utilizadas com consciência e auto-compreensão tornam a vida mais tolerável e mais bem-sucedida. P 63

“À medida que a criança se torna ciente da excitação sexual que não pode ser satisfeita, as 'excitações' sexuais evocam forças mentais contrárias que, a fim de suprimir este desprazer com eficácia, erigem as represas mentais de repulsa, vergonha e moralidade” (S. Freud, 1905, p 178). Não apenas a idéia original é reprimida, mas qualquer vergonha ou auto-reprovação que poderia surgir pela admissão destes pensamentos também é excluída da consciência. P 65

A ânsia que está sendo negada precisa ser repetidamente obscurecida. P 65

O ato de atribuir a outra pessoa , animal ou objeto as qualidades, sentimentos ou intenções que se originam em nós mesmos se chama projeção. É um mecanismo de defesa em que aspectos de nossa própria personalidade são deslocados de dentro do indivíduo para o ambiente externo. A ameaça é tratada é tratada como se fosse uma força externa. P 66

Sublimação é o processo mediante o qual a energia originalmente dirigida a metas sexuais ou agressivas é redirigida a novos objetivos – com freqüência artísticos, intelectuais ou culturais. A sublimação foi chamada de “defesa bem sucedida” (Fenichel, 1945). P 66

A civilização estimula a transcendência de impulsos originais e, em alguns casos, cria metas alternativas que podem ser mais satisfatórias para o id do que a satisfação dos impulsos originais. P 67

As defesas aqui descritas são modos que a psique dispõe de se proteger da tensão interna ou exterior. P 67

Os adolescentes (...). Eles formam as relações amorosas mais apaixonadas, mas as rompem tão abruptamente quanto as iniciaram. Por um lado, lançam-se entusiasmadamente à vida da comunidade e, por outro, possuem um anseio irressistível de solidão. Oscilam entre a cega submissão a algum líder de sua escolha e a rebeldia desafiadora contra toda e qualquer autoridade. São egoístas e materialistas e, ao mesmo tempo, repletos de elevado idealismo. São ascéticos, mas subitamente podem mergulhar em prazeres instintuais do caráter mais primitivo. P 81

CARL ROGERS


FADIMAN, James e FRAGER Robert. Carl Rogers e a perspectiva centrada na pessoa. In: Personalidade e Crescimento pessoal. Porto Alegre: Editora Artmed, 2004, 5ª edição

A premissa básica de Rogers é a de que as realidades das pessoas são assuntos pessoais e só podem ser conhecidas pelos próprios indivíduos. P 359

Existe um campo da experiência peculiar a cada indivíduo; esse campo contém “tudo o que está acontecendo dentro do envoltório do organismo em qualquer momento e está potencialmente disponível à consciência. P 359

Nossa atenção, ainda que teoricamente aberta à qualquer experiência, se concentra em preocupações imediatas para exclusão de quase tudo o mais. Quando estamos como fome, nosso campo da experiência é completamente preenchido por pensamentos sobre comida. P 359

Da noção de fluidez, Rogers formulou a crença de que as pessoas não apenas são capazes de crescimento e desenvolvimento pessoal, mas que essa mudança positiva é uma progressão natural e esperada. O self ou conceito-de-self, então, é o entendimento que uma pessoa tem de si mesma, baseado na experiência passada, nos dados presentes e nas expectativas futuras. P 359

A self ideal é “o autoconceito que o indivíduo mais gostaria de possuir, sobre o qual atribui o maior valor para si mesmo” (Rogers, 1959, p. 200). O self ideal é um modelo pelo qual uma pessoa pode se esforçar. Como o self, ele é uma estrutura mutante, constantemente sofrendo redefinição. P 359

O self ideal pode se tornar um obstáculo para a saúde pessoal quando ele difere muito do self real. As pessoas que sofrem dessa discrepância muitas vezes não estão dispostas a ver a diferença entre ideais e atos. P 360

Rogers conclui que em cada um de nós existe um impulso natural para sermos o mais competentes e capazes que biologicamente pudermos ser. Assim como uma planta cresce para se tornar uma planta saudável, e uma semente contém de si o impulso para tornar-se uma árvore, também uma pessoa é compelida a tornar-se uma pessoa inteira, completa e auto-realizada. P 360

A suposição de que o crescimento é possível e central para o propósito do organismo, é crucial no pensamento de Rogers. P 361

Para Rogers, a tendência para a auto-realização não é simplesmente outro motivo entre muitos; ela é o impulso primordialmente motivacional. P 361

Esta, a nosso ver, é a alienação básica no homem. Ele não foi fiel a si mesmo, sua valorização organísmica natural da experiência, mas, em nome da preservação da consideração positiva dos outros, passou a falsificar alguns dos valores que experimenta e a percebê-los apenas em termos de seu valor para os outros. Contudo, essa não foi uma escolha consciente, mas um desenvolvimento natural – e trágico – no início da infância. (1959, p. 226) p 365

Rogers observou que o comportamento psicótico muitas vezes parece estar ocorrendo a partir de um aspecto anteriormente negado da experiência do indivíduo. P 365

A terapia centrada no cliente se esforça para estabelecer uma atmosfera em que as condições prejudiciais de valor possam ser postas de lado, permitindo assim que as forças de saúde, que Rogers considera naturais, retomem seu domínio original. P 365

Os relacionamentos são necessários para descobrir o self. Rogers acredita que os relacionamentos capacitam o indivíduo a diretamente descobrir, desvelar, experimentar ou confrontar seu self real. Nossas personalidades tornam-se visíveis a nós sobretudo através do relacionamento com os outros. Em terapia, em situações de encontro e nas interações diárias, o feedback dos outros nos oferece oportunidades de nos experimentarmos. P 366

Inúmeros problemas decorrem da tentativa de realizar as expectativas dos outros em vez das nossas. “Viveremos por nossas escolhas, com os entendimentos organísmicos mais profundos de que somos capazes, mas não seremos moldados pelos desejos, regras, papéis que os outros estão ansiosos a nos fazer aceitar” (1972, p. 260) p 367

Talvez eu possa descobrir e chegar mais perto do que realmente sou no mais íntimo – às vezes sentindo-me zangado ou apavorado, às vezes amoroso e afetivo, de vez em quando bonito e forte ou impetuoso e terrível – sem esconder esses sentimentos de mim mesmo. Talvez eu possa avaliar-me como a pessoa altamente variada que sou. Talvez eu possa ser mais abertamente essa pessoa. Neste caso, posso viver de acordo com meus próprios valores adquiridos por experiência, ainda que tenha consciência de todos os códigos da sociedade. Então eu posso me permitir ser toda esta complexidade de sentimentos e significado e valores com meu parceiro – ser livre o suficiente para dar o amor, a cólera e a ternura que existem em mim. Possivelmente então eu possa ser um verdadeiro integrante de uma parceria, porque estou no caminho para ser uma pessoa de verdade. P 367

Rogers considera que é melhor que as pessoas decidam o que fazer por si mesmas, com apoio dos outros, do que fazerem o que os outros decidem por elas. P 368

Uma característica final é confiar em nossos impulsos interiores e juízos intuitivos, ... p 369

“A pessoa que oferece mais esperança em nosso mundo louco de hoje, que poderia ser liquidado, é o indivíduo que está mais plenamente cônscio – mais plenamente consciente do que está acontecendo dentro de si” (Rogers, em Kirsschenbaum e Henderson, 1989, p.189) p 370

Sua abordagem baseava-se no impulso do indivíduo para o crescimento, saúde e adaptação. A terapia era um modo de libertar o cliente para retomar seu desenvolvimento normal. Ela enfatizava o sentimento mais do que o intelecto, a situação imediata de vida mais do que o passado. P
370